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Municípios são ambientes perfeitos para a prática ESG, a sigla internacional para Sustentabilidade Ambiental, Igualdade Social e Governança Corporativa, a nova regra para avaliação de investimentos.

Desde que os maiores investidores estabeleceram tais critérios para escolha das melhores opções, empresas de todos os continentes trabalham suas vantagens competitivas. O lado mais conhecido e menos polêmico é o Ambiental (Environment). Porém, mesmo nos países ricos, o lado Social do tripé sofre de interpretações e adaptações conforme a organização.

Novo no negócio, o Brasil vai se apresentando como um grande desafio para a aplicação do ESG. O meio ambiente sofre ataques deliberados de setores econômicos de alto impacto, sob graves denúncias de aquiescência. A Governança Corporativa dá passos cambaleantes diante de maus exemplos governamentais. E o lado Social tem o desafio de vencer abismos e barreiras estruturadas em vários séculos de escravidão da raça negra. 

As primeiras iniciativas para resolver o "S" do ESG brasileiro vêm chegando pelas mãos de grandes empresas como a AMBEV e MAGAZINE LUIZA, que estabeleceram programas de contratações e capacitação de seus recursos humanos.

O caminho para a retomada da economia passa pelas cidades, onde tudo acontece. Mas cidades são pessoas. E, segundo o IBGE, pessoas negras longe dos Poderes de Decisão, apesar de representarem mais da metade da população.


 

O Cenário da Desigualdade Racial no Brasil

56,1 %.
Esse é o percentual de pessoas que se declaram negras no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua do IBGE, em 2018.
Dos 209,2 milhões de habitantes do país, 19,2 milhões se assumem como pretos, enquanto 89,7 milhões se declaram pardos. Os negros – que o IBGE conceitua como a soma de pretos e pardos – são, portanto, a maioria da população.

No entanto, a superioridade nos números não se reflete na sociedade brasileira.
"A população de cor ou raça preta ou parda possui severas desvantagens em relação à branca, no que tange às dimensões contempladas pelos indicadores apresentados - mercado de trabalho, distribuição de rendimento e condições de moradia, educação, violência e representação política". Na conclusão do estudo, o IBGE aponta que as desigualdades étnico-raciais "têm origens históricas e são persistentes". (Conclusão do IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
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Tudo começa com o Negacionismo e o Racismo Estrutural

O Brasil tem a 2ª maior população negra do mundo, ficando atrás somente da Nigéria e foi, também, o último país das Américas a abolir oficialmente a escravatura, em 1888. Foram mais de 300 anos de escravidão e as consequências estruturais do longo passado escravagista permanecem até hoje, isto é, o racismo continua assumindo diversas formas de manifestação.

Entretanto, com as mídias sociais do mundo virtual, intensificou-se a produção discursiva de uma espécie de negacionismo gourmetizado, aparentemente sedutor, mas profundamente enganoso, segundo estudos de Bruno Antonio Barros Santos. Um lugar-comum que cultiva a negação da história por meio da simplificação da linguagem, ao mesmo tempo em que empurra as problematizações para o campo “estéril” da perda de tempo. Em outras palavras: discutir escravidão, desigualdade racial e racismo seriam coisas de esquerdista desocupado e improdutivo; algo de gente que “tá viajando” – fazendo uso de uma gíria popular.

Nesse sentido, há uma proposital negação da existência do racismo e da desigualdade entre brancos e negros. Além disso, há também uma negação dos efeitos estruturais do passado escravocrata na fala recorrente de muitas pessoas que dizem que não têm nada a ver com o que aconteceu no passado e, por isso, não seria justo pagarem por uma dívida histórica de que não participaram e nem ajudaram a construir. São falas sem constrangimento em verbalizar o absurdo.

Nesse contexto negacionista gourmetizado, há um tempero (discurso de que todos são iguais, com a falácia da meritocracia) para ocultar a comida insossa (perpetuar a desigualdade). Mas esses discursos que estão sendo descortinados e desmascarados, o que tem intensificado, por outro lado, a reação virulenta do status quo em alimentar o negacionismo da história e da opressão.

Desse modo, o negacionismo gourmetizado plastifica o conteúdo da informação, através de uma retórica apelativa e atraente, a exemplo do discurso que relativiza– e diminui – o Dia da Consciência Negra, questionando o porquê de não termos, nacionalmente, o Dia da Consciência Branca. É uma negação empacotada e estilizada para simular uma suposta defesa da “igualdade”.

A propósito, Djamila Ribeiro esclarece o que seria esse "racismo reverso":
Não existe racismo de negros contra brancos ou, como gostam de chamar, o tão famigerado racismo reverso. Primeiro, é necessário se ater aos conceitos. Racismo é um sistema de opressão e, para haver racismo, deve haver relações de poder. Negros não possuem poder institucional para ser racistas. A população negra sofre um histórico de opressão e violência que a exclui. Para haver racismo reverso, precisariam ter existido navios branqueiros, escravização por mais de trezentos anos da população branca, negação de direitos a ela. Brancos são mortos por serem brancos? São seguidos por seguranças em lojas? Qual é a cor da maioria dos atores e apresentadores de TV? Dos diretores de novelas? Da maioria dos universitários? Quem detém os meios de produção? Há uma hegemonia branca criada pelo racismo que confere privilégios sociais a um grupo em detrimento de outro. […] um jovem negro pode ser morto por sua cor. Posso não ser contratada por uma empresa porque sou negra, ter mais dificuldades de acesso à universidade por isso. Crianças negras crescem sem autoestima porque não se veem na TV ou nos livros didáticos. Isso sim tem poder de influenciar minha vida. Racismo vai além de ofensas, é um sistema que nos nega direitos. […] para haver racismo deve haver relação de poder, e a população negra não está no poder. Acreditar em racismo reverso é mais um modo de mascarar o racismo perverso com que vivemos.

Ora, são mais de 300 anos de escravidão negra no Brasil, sendo que essa escravidão teve amplo suporte estrutural e institucional, inclusive da própria Igreja Católica à época. E, após a abolição da escravatura, houve um processo de branqueamento da população brasileira, sobretudo no início do século XX, com mais atuação na região sul do país, em que governos estabeleceram “cotas” (distribuição de terras) para os imigrantes (italianos, alemães etc.), com o objetivo de estimular esses europeus a migrarem para o Brasil, enquanto que os negros não tiveram qualquer incentivo do Estado nesse sentido. Desse modo, raciocinemos um pouco: Escravos negros recém-libertados, sem apoio institucional do Estado, tinham condições efetivas de não viverem à margem da sociedade? Essa violência histórica e estrutural não tem qualquer efeito hoje? O negacionismo faz algum sentido?


Nos Estados Unidos, a onda de reações após as mortes de negros por policiais em ações violentas, nada mais é que reflexo de uma história de racismo em suas variações. A explosão é uma reação "natural" de um combustível acumulado em local e condições de alto risco.

Enquanto isso no Brasil, a pandemia da Covid-19 também escancarou tudo. Com a economia em queda, passou a valer a máxima caipira dos instintos primitivos: "Farinha pouca, meu pirão primeiro". Desemprego, fome, dívidas, depressão, perdas, medo, ódio racial... e a Covid 19 soprou o véu que encobria a verdadeira face do racismo. Como se nascer branco garantisse direitos absolutos sobre todas as outras raças. Maus exemplos compartilhados de várias partes do mundo, libertaram a vontade de apagar nossa história feita de invasões, escravizações, colonizações e miscigenações.
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13 de Maio

A lei Áurea, assinada pela princesa-regente Isabel, em 13 de maio de 1888, representou do ponto de vista jurídico apenas a abolição da escravidão, um crime contra a humanidade e que no Brasil, até então, era uma prática institucionalizada desde o século 16. O que poderia ser uma lei libertária, foi na realidade apenas um paliativo para responder às pressões internas e externas e para que o país deixasse de ser um anacronismo na medida em que o Brasil era no final do século 19, na vesperal da proclamação da república, a única nação escravista do mundo.

No entanto, a lei Áurea não acabou com o trabalho escravo (que ainda persiste na ilegalidade), não extirpou o racismo e a discriminação étnico-racial e não concedeu a cidadania aos negros e negras brasileiros, já que não criou as condições necessárias para a inserção dos mesmos no ordenamento social do país, muito embora sejam eles responsáveis pela riqueza e pela extraordinária diversidade cultural que caracteriza a sociedade brasileira. E nem mesmo as leis abolicionistas anteriores à Lei Áurea – Lei do Ventre Livre, de 1871, e a lei dos Sexagenários 1885 -, significaram liberdade, dignidade e cidadania para crianças e idosos negros.

Segundo Cristina Almeida, Deputada Estadual (PSB-AP), o que ocorreu de fato, com a abolição da escravidão, foi a mudança dos negros das senzalas para as favelas para viverem, embora livres do trabalho escravo, em condições de extrema pobreza e miséria semelhantes ou piores em relação aos tempos de cativeiro. A eles não foram dadas condições ainda que mínimas para o acesso à educação, saúde, moradia, emprego e outros fatores indispensáveis para que seres humanos tenham o direito à vida com dignidade para que pudessem exercer soberana e plenamente o sagrado direito à cidadania.

Por essas e outras razões de ordem política, econômica, sociocultural e até mesmo religiosa – no caso do preconceito e discriminação lançados sobre as religiões de matriz africana -, que o 13 de maio não é comemorado pelos movimentos negros espalhados por todo o Brasil e pelos setores progressistas da sociedade brasileira. A magnitude e o simbolismo das importantes datas cívicas e culturais é merecidamente atribuída ao dia 20 de novembro que desde os anos 1970 foi adotado como a data mais importante e simbolicamente representativa para os negros e negras brasileiros, porque nessa data, em 1695, há 322 anos, foi assassinado Zumbi dos Palmares, líder e herói do Quilombo dos Palmares, maior ícone da luta negra contra o preconceito e a discriminação da história deste país.

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Vítimas de violência

A morte de um homem negro desarmado, depois de ser imobilizado no chão com um policial ajoelhado no pescoço dele, reacendeu o debate sobre a brutalidade da polícia contra as minorias raciais nos EUA.

Mas a polícia dos Estados Unidos matou 1.099 pessoas em 2019. Dessas, 259 eram negras (24%). No Brasil, a polícia fez quase 6 vezes mais vítimas: 5.804 até o ano passado. Do total, 75% (ou 4.533) eram negros.

333,9 milhões de habitantes nos EUA x 211 milhões de habitantes no Brasil


Negros são as maiores vítimas de homicídios no Brasil. Segundo o Atlas da Violência, em 2017, 75,5% das pessoas assassinadas no país eram pretas ou pardas – o equivalente a 49.524 vítimas. A chance de um jovem negro ser vítima de homicídio no Brasil é 2,5 vezes maior do que a de um jovem branco.

Em 10 anos – de 2007 a 2017, o Brasil se tornou um país com mais potencial de morte para negros do que para não-negros. A taxa de homicídios de negros cresceu 33,1% no período, enquanto a de brancos aumentou 3,3%. Ou seja, os negros são os que mais morrem e também são a população em que a taxa de mortes violentas mais cresce.

Entre todos os estados, o Rio Grande do Norte é o mais violento para os negros. Em 2017, a taxa de homicídios de pretos ou pardos foi de 87 a cada 100 mil habitantes. O índice, o mais alto do país, é superior ao dobro da média nacional – 43,1 negros mortos a cada 100 mil habitantes.

Negros também são maioria entre os que morrem em decorrência de ações de agentes de segurança do Estado. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019, 74,5% das pessoas assassinadas em intervenção policial são pretas ou pardas.

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Violência contra a mulher negra

Se a pandemia do novo coronavírus deixou mais evidente as diferenças da sociedade, isso passa, sem dúvida, pela figura da mulher negra no país.

As mulheres negras são vítimas mais recorrentes de homicídios. Segundo o Atlas da Violência, a taxa de assassinatos dessas mulheres cresceu 29,9% de 2007 a 2017. No mesmo período, o índice de homicídio de mulheres não-negras cresceu 4,5%.

As mulheres negras são o principal grupo de risco nos casos de feminicídio. Os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019 mostram que 61% das mulheres que sofreram feminicídio no Brasil eram negras.
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Sistema carcerário. Para negros

Levantamento mostra que a maior parte dos presos no Brasil são jovens, pretos ou pardos e com baixa escolaridade. Os crimes que mais levam a prisões são roubo e tráfico de drogas.

Os negros são a maioria entre as pessoas presas no Brasil. Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias Atualização, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, aponta que 61,6% dos detidos no país eram pardos ou pretos em junho de 2017 (dados mais recentes disponíveis). Os brancos representavam 34,38% dos presos.

Menos de 2% dos condenados por "crimes do colarinho branco" cumprem pena. (STF 2020)
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Saúde

A Covid-19 também mostrou o abismo social na área da saúde. No início do surto, o novo coronavírus pareceu não poupar ninguém: todos estariam igualmente expostos à doença. Não demorou muito para que dados derrubassem o equívoco e escancarassem o impacto das desigualdades sociais na prevenção e propagação da pandemia. Em países como Estados Unidos, Índia e Brasil, campeões de casos no mundo, é quase impossível não falar de desigualdade social e racismo também na saúde.
Pretos e pardos representam cerca de 56% da população brasileira, mas até o início de 2021 somavam mais de 60% dos mortos que tiveram a etnia especificada na ficha de atendimento. O efeito da desigualdade social é visível ainda por outro critério. Pretos e pardos somavam 36,7% de todos os infectados quando se incluem na conta os sobreviventes e aqueles que não tiveram raça determinada nos registros, mas 40% das notificações de óbito por esse viés ampliado.

Isso significa que essa parcela da população, associada a uma renda média mais baixa e mais dificuldade de acesso aos serviços de saúde do que os brancos, morre em proporção maior do que o seu nível de infecção. Com os brancos, é o contrário: representavam 29,7% de todos os contaminados (incluindo quem não teve indicação de etnia), mas 27,9% dos mortos.

Após um ano de pandemia, a população negra representava 67% do público total atendido pelo SUS (Sistema Único de Saúde), segundo dados do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) incluídos na Política Nacional de Saúde Integral da População Negra de 2017 do Ministério da Saúde. Pretos ou pardos estavam ainda 73,5% mais expostos a viver em um domicílio com condições precárias do que brancos, e sofrem mais com diabetes, hipertensão e asma, doenças que pioram o quadro da COVID-19. (Os dados desta Edição Especial serão atualizados)

Rita Helena Borret, médica de Família e Comunidade, coordenadora do Grupo de Trabalho de Saúde da População Negra da SBMFC (Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade) e membro do coletivo NegreX, explica que a pandemia pode afetar mais os jovens negros por vários motivos.

O primeiro deles é o fato de estarem mais vulneráveis à contaminação. “Esse grupo representa maioria desproporcional entre as pessoas sem acesso a saneamento básico e vivendo em condições de adensamento urbano em favelas e periferias. A população negra também representa a maioria entre desempregados e entre empregados informais, o que lhes confere maior instabilidade financeira nesse momento da quarentena e os expõe à necessidade de sair para trabalhar, visto que as entidades governamentais não assumem o papel de garantir fonte de subsistência para os brasileiros durante a pandemia”, explica Rita.

Aliado à dificuldade de isolamento social, há o racismo estrutural, que atinge, principalmente os jovens negros. “A utilização de máscaras caseiras coloca esses jovens na situação de serem abordados com maior frequência pelas forças de segurança por sua imagem de máscara estar socialmente associada a ‘pessoas perigosas em potencial’”, diz a médica.
A doutora em Saúde Pública Edna Maria de Araújo, que é professora de pós-graduação em Saúde Coletiva, coordenadora do NUDES (Núcleo Interdisciplinar de Estudos sobre Desigualdades Sociais em Saúde) da UEFS (Universidade Estadual de Feira de Santana) e integrante da diretoria da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva), concorda com Rita.

“Eles estão mais expostos, seja por atuarem em ocupações essenciais como entregadores de alimentos, medicamentos, por serem caixas de supermercados, comerciários, por se exporem na ocupação informal, por representarem uma boa parte da população privada de liberdade, por fazerem parte da população em situação de rua, ainda por falta de informação ou até mesmo por não obedecerem às orientações sanitárias de proteção contra a COVID-19 por acharem que não serão atingidos”, explica Edna.

Mais vulnerável à contaminação, a população negra também é a que apresenta maior dificuldade de acesso aos cuidados em saúde necessários para lidar com a COVID-19, segundo Rita. “A concentração de unidades de saúde de urgência e emergência, de leitos hospitalares, leitos de cuidados intensivos e respiradores é desigual entre os setores público e privado, o que representa uma iniquidade em saúde”, afirma.

Os mais pobres (os negros) ainda protelam a decisão de procurar o médico até ser tarde demais. Por conta, muitas vezes, de desnutrição e condições insalubres, situações estressantes, impossibilidade de faltar ao trabalho, necessidade de cuidar dos filhos e da casa... acabam não sobrevivendo e deixam órfãos...

Propositalmente, não abordamos neste estudo a situação do acesso do negro aos serviços de saúde pública, para doenças anteriores à Pandemia do Covid-19.
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Educação

Na área da educação, a evasão, que já é maior entre negros no ensino médio, deve aumentar depois da pandemia, segundo Alexsandro Santos, doutor em Educação pela USP (Universidade de São Paulo), pesquisador do Núcleo de Estudos da Burocracia da FGV (Fundação Getulio Vargas) e diretor-presidente da Escola do Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo. “O ensino médio, a gente precisa compreender, que, infelizmente, para uma parcela grande da nossa população preta e pobre, ainda é um privilégio, não é um direito”, diz.

As mesmas vulnerabilidades que fazem com que negros sejam as principais vítimas do COVID-19 são lembradas por Alexsandro como dificuldades para estudar em casa durante o período de isolamento social. “Vivem em moradias que, provavelmente, não permitirão que esses jovens negros tenham um canto sossegado para estudar, que possam organizar seus materiais numa mesa para fazer suas tarefas ou que tenham acesso à internet, pacote de dados, para utilizar as plataformas de educação a distância que o governo dispõe.”

Para Suelaine Carneiro, socióloga, mestre em Educação e integrante do Geledés Instituto da Mulher Negra, a pandemia dificulta o acesso à educação. “O que está em ação são algumas propostas de educação a distância, educação remota, e uma variedade de denominações que, no fundo, representam uma educação mediada pela tecnologia ou programas que vão ser disponibilizados na televisão ou nos meios digitais, via programas na internet. É um espaço ao qual a população negra em geral tem menor acesso”, afirma Suelaine.

Suelaine fala sobre a importância da mediação de um adulto. “Você tem um grande número de estudantes negros que, se o pai ou mãe não estiver desempregado, tem que sair durante a pandemia para fazer algum tipo de atividade para ter renda, por outro lado, você também tem um grande número de familiares que trabalham na linha de frente dos serviços essenciais. São situações que inviabilizam o processo de aprendizagem e podem contribuir para a evasão, para o desestímulo e para as dificuldades, todas, desse processo educativo”, explica.
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Analfabetismo

A taxa de analfabetismo entre negros de 15 anos ou mais diminuiu nos últimos anos – de 9,8% em 2016 para 9,1% em 2018. Ainda assim, é maior do que o dobro da taxa de analfabetismo entre brancos da mesma idade, que ficou em 3,9% no ano passado, segundo o IBGE.

De acordo com o Anuário Brasileiro da Educação Básica 2019, organizado pela ONG Todos Pela Educação, a taxa de alfabetização que mais cresceu no período de 2012 a 2018 foi a de pretos. Em 2012, 87,7% deles estavam alfabetizados. Em 2018, a taxa subiu para 91%. Entre os pardos, o índice era de 88,1% em 2012 e passou a 90,9% em 2018.

A erradicação do analfabetismo é uma das metas estabelecidas pelo Brasil no Plano Nacional de Educação (PNE), que estabelece o ano de 2024 como limite para a conclusão do objetivo.
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Educação Superior

Na outra ponta, pela primeira vez, os negros são maioria no ensino superior público. Segundo o estudo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil, do IBGE, em 2018, 50,3% dos estudantes das instituições públicas eram pretos ou pardos.

O número de pretos e pardos de 18 a 24 que estavam estudando também aumentou no ano passado, passando de 50,5% em 2016 para 55,6% em 2018. No entanto, ainda é menor do que o de estudantes brancos da mesma idade, que chegou a 78,8% em 2018.

De acordo com a Sinopse Estatística da Educação Superior de 2018, do Inep, a maioria dos negros que estão no ensino superior no Brasil estudam em universidades particulares. Naquele ano, dos 591 mil pretos que cursavam o ensino superior, 66,86% frequentavam instituições privadas. Entre os 2,4 milhões de pardos em instituições de ensino superior, 73,54% estavam em rede privada. 
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Mercado de Trabalho

Em 2018, os negros eram a maior parte da força de trabalho no Brasil – 54,9%. A proporção de pretos e pardos entre as pessoas desocupadas e subocupadas, porém, é muito maior. No ano passado, eles correspondiam a cerca de dois terços das pessoas que não tinham emprego – 64,2% – e das que trabalhavam menos horas do que gostariam ou poderiam – 66,1%. Os dados são do estudo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil, do IBGE.

Os negros também são os que mais sofrem com a informalidade, que vem crescendo no Brasil nos últimos anos. Em 2018, 47,3% das pessoas ocupadas pretas ou pardas estavam em trabalhos informais, segundo o estudo do IBGE. Entre os brancos, o percentual de pessoas em ocupações informais era menor: 34,6%.

Uma pesquisa do Instituto Ethos mostrou que os negros ocupam apenas 4,9% das cadeiras nos Conselhos de Administração das 500 empresas de maior faturamento do Brasil. Entre os quadros executivos, eles são 4,7%. Na gerência, apenas 6,3% dos trabalhadores são negros.

Pretos e pardos são maioria no mercado de trabalho somente entre aprendizes e trainees – 57% e 58% dos trabalhadores, respectivamente. 
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Desemprego

O desemprego é um dos principais problemas enfrentados pelos brasileiros nos dias de hoje e isso se agrava ainda mais quando a pessoa é negra. Os negros e pardos têm mais dificuldade de conseguir trabalho e, quando conseguem, recebem menos do que a população branca, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua). Quando se trata de desemprego, a taxa da população negra é de 14,9%, já a dos brancos, de 9,2%.

Em relação à remuneração, os afrodescendentes têm uma média de R$ 1.608, enquanto os brancos recebem cerca de R$ 2.796, o que só reforça a ideia da desigualdade étnica no mercado de trabalho. No estado de São Paulo, o negro ganha 44% a menos do que o branco.

Segundo o IBGE, entre 2012 e 2018 os negros estão mais presentes nas atividades agropecuárias (60,8%), na construção (62,6%) e nos serviços domésticos (65,1%), atividades que normalmente pagam menos. E eles ainda são 64% das pessoas desempregadas no país. Já nos setores de administração pública, saúde, educação e serviços sociais, a presença dos brancos se sobressai.

As taxas de desocupação e subutilização também têm maiores índices entre pretos e pardos. "Apesar de serem pouco mais da metade da força de trabalho (54,9%), elas formavam cerca de 2/3 dos desocupados (64,2%) e dos subutilizados (66,1%) na força de trabalho em 2018", diz o informe. No quesito de taxa composta de subutilização (que é a soma de populações subocupadas, desocupada e fora de trabalho potencial), entre os negros ela ficou em 29% contra 18,8 entre os brancos. Os negros também têm mais trabalhos informais que os brancos.

Ficam fora das estatísticas oficiais, os chamados desalentados, aqueles que desistiram de procurar emprego, após anos de tentativas frustradas.
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Salários mais baixos para negros

A diferença entre raças também aparece quando a comparação é feita com base dos salários. "O rendimento médio domiciliar per capita também apresentou diferenças entre os dois grupos de cor ou raça. Na população branca, esse rendimento superou em quase duas vezes o da população preta ou parda —R$ 1.846 contra R$ 934", diz o informativo.

Um ponto que chama a atenção é que, quando esse número é comparado com as diferenças de gênero, em regra os negros perdem mais para os brancos do que as mulheres para os homens. "As razões de rendimentos entre categorias de cor ou raça e de sexo indicam que o diferencial por cor ou raça é maior do que o diferencial por sexo. Enquanto as mulheres receberam 78,7% do valor dos rendimentos dos homens, em 2018, as pessoas de cor ou raça preta ou parda receberam apenas 57,5% dos rendimentos daquelas de cor ou raça branca." Entre as pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza extrema (classificada na pesquisa como US$ 1,90 por dia ou em torno de R$ 7,60), os negros também dominam: enquanto 3,6% das pessoas brancas tinham rendimentos inferiores a esse valor, entre pessoas pretas ou pardas eram 8,8%.
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Distribuição de Renda

Os negros ganham menos no Brasil do que os brancos. Segundo o IBGE, o rendimento médio domiciliar per capita de pretos e pardos era de R$ 934 em 2018. No mesmo ano, os brancos ganhavam, em média, R$ 1.846 – quase o dobro.

Entre os 10% da população brasileira que têm os maiores rendimentos do país, só 27,7% são negros.

As taxas de pobreza e de pobreza extrema são maiores entre a população negra. Em 2018, 15,4% dos brancos viviam com menos de US$ 5,50 por dia no Brasil – valor adotado pelo Banco Mundial para indicar a linha de pobreza em economias médias, como a brasileira. Entre pretos e pardos, o percentual era maior: chegava a 32,9% da população.

A pobreza extrema – quando a pessoa vive com menos de US$ 1,90 por dia – atinge 8,8% da população negra no Brasil e 3,6% da população branca. Os dados são do IBGE.
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Representatividade

Após anos de escravidão e influências europeias sob território tupiniquim, a ausência das populações negras nos palcos decisórios, de debate e de poder na sociedade brasileira se tornou algo natural, defende o pesquisador. “Parte dos próprios negros se acostumaram com sua ausência e naturalizaram a ideia”.

Segundo o pesquisador Osmar Teixeira Gaspar, um veículo de comunicação de massa participa das decisões e dos processos de construção de uma sociedade. Por isso, um veículo de massa traz poder às pessoas que o possuem ou que fazem parte de sua programação e “atualmente, não há interesse que a população negra alcance esse poder e tenha voz para fomentar seus avanços sociais”.

Por fim, Gaspar ressalta que deve-se apenas defender a Constituição Federal. “Nossa Constituição não hierarquiza e tampouco admite qualquer tipo de censura aos brasileiros em razão de seu fenótipo. Ao contrário, ela lhes assegura o direito de gozarem das mesmas oportunidades, representatividade e visibilidade”, diz.

Contudo, continua, é necessário que o Estado brasileiro implemente políticas públicas que efetivamente democratizem e assegurarem o acesso e a inserção desta população negra aos meios de comunicação de massa, de forma proporcional à sua representatividade dentro da sociedade brasileira. “Entendo que a televisão comercial deve ser lucrativa, mas por outro lado, não se pode desvalorizar o ser humano. A TV deve e pode investir em uma grade de programação plural que aborde diversos aspectos culturais do Brasil e das etnias que compõem nossa sociedade”, conclui.
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Ausência na Mídia

Baixa representatividade negra na mídia gera menos oportunidades de trabalho e alimenta o preconceito racial, segundo estudos.

Meios de comunicação do país ainda não incorporaram negros – A baixa representatividade negra nas programações e propagandas veiculadas nos grandes meios de comunicação de massa no Brasil podem significar menores oportunidades de trabalho e alimentar um preconceito racial velado no país, aponta estudo realizado na Faculdade de Direito (FD) da USP. Para o pesquisador Osmar Teixeira Gaspar, responsável pelo trabalho, “ter visibilidade acarreta algumas possibilidades ao longo da vida e a falta dela também pode criar um ideário popular de que determinadas funções devem ser ocupadas por determinados esteriótipos”.

Segundo o pesquisador todo material publicitário atualmente ainda é feito com um recorte racial, assim como algumas telenovelas. “Você raramente vê algum médico ou cientista negro nas telenovelas, isso faz um garoto negro pensar que, devido à sua cor, jamais poderá participar daquele universo branco e exercer aquelas funções. Esta censura midiática desperdiça e marginaliza talentos”, afirma Gaspar. “Isso não incentiva negros a almejar determinadas profissões.”

Até no Cinema...

Apenas recentemente, em julho de 2020, em mais um passo para aumentar a inclusão e diversidade, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood anunciou que convidou 842 novos membros de 59 países, sendo que a metade é de mulheres.

No Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, os negros representam apenas 1.30% de todos os indicados ao prêmio de melhor direção, por exemplo. Em 15 anos da premiação, apenas uma pessoa negra ganhou a honraria nesta categoria – o cineasta Jeferson De com o filme Bróder (2009). Nos indicados de melhor roteiro original, 0,60% eram homens pardos e 1,3% eram homens pretos.

A desigualdade também aparece no júri, ou seja, nas pessoas que escolhem os ganhadores do prêmio. Neste grupo, 45,99% eram homens brancos, 43,79% eram mulheres brancas, 4.41% eram homens pretos, 4.41% eram mulheres pretas, 0,70% eram homens pardos e 0,70% eram mulheres pardas. Os dados são do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA).
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Representatividade no Poder

Falando ao Programa Encontro, na Rede Globo, o ator Zulu falou o que sentiu ao assistir o vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril. “O que me incomoda mais é a falta [de negros] nos lugares de decisão. Quando olhei aquela bancada gigante como se fosse uma Santa Ceia e não vi ninguém de pele preta, ali, mais uma vez, cheguei à conclusão que nós não ocupamos os espaços de decisões”, dispara.

“Ou seja: onde a gente não estiver para falar da gente, não vão falar da gente. Infelizmente não falarão da gente. E está tudo debaixo do guarda-chuva do racismo. Não é só a morte de um homem preto. É a morte de um homem preto, a desigualdade social, é a fila do emprego, a gente não frequentar os bons restaurantes, olhar para o lado em um teatro e não se ver... A gente não se reconhece”, disse.

Zulu falou o que sentiu ao assistir o vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril. “O que me incomoda mais é a falta [de negros] nos lugares de decisão. Quando olhei aquela bancada gigante como se fosse uma Santa Ceia e não vi ninguém de pele preta, ali, mais uma vez, cheguei à conclusão que nós não ocupamos os espaços de decisões”, disparou.
Nos governos estaduais e municipais, a nomeação de secretários e cargos do primeiro e segundo escalões ainda é praticamente nula.

Pardos e pretos são minoria também no Poder Legislativo, apesar de esta representação ser vital para a construção de debates e projetos que diminuam a desigualdade no Brasil. Negros são apenas 24,4% dos deputados federais e 28,9% dos deputados estaduais eleitos em 2018. Nas eleições municipais de 2016, eles eram 42,1% dos vereadores eleitos. A partir destas eleições municipais, as verbas partidárias deverão ser distribuidas proporcionalmente aos candidatos negros, segundo o Tribunal Superior Eleitoral - TSE.

A diferença também aparece no Judiciário. Dados do Conselho Nacional de Justiça, mostram que havia 14,2% magistrados pardos e 1,4% magistrados pretos em 2013 – último ano com informações disponíveis. A imensa maioria dos magistrados são brancos (83,8%).

Nos Tribunais Superiores – Superior Tribunal de Justiça (STJ), Supremo Tribunal Federal (STF), Tribunal Superior do Trabalho (TST), Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e Superior Tribunal Militar (STM) – os números são ainda menores: 1,3% se declaram pretos e 7,6%, pardos. Em toda a história, apenas três negros ocuparam uma cadeira no STF: os ministros Joaquim Barbosa, indicado em 2003 pelo ex-presidente Lula, Hermegenildo de Barros, nomeado em 1919 e aposentado em 1937, e Pedro Lessa, ministro entre 1907 e 1921.
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"Políticas Afirmativas" contra o Negacionismo

Durante o 2ª Encontro Nacional de Juízas e Juízes Negros, em Brasília, o então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, defendeu as ações afirmativas, como as cotas nas universidades com base em critérios étnico-raciais. Para ele, o racismo no Brasil é estrutural e tais políticas são eficazes na promoção de igualdade.

“Políticas afirmativas vão ao encontro da integração dos setores desfavorecidos, soerguendo em cidadania os indivíduos a quem é dirigida a discriminação racial sistêmica”, disse o ministro. “No racismo estrutural ou institucional, disseminado na sociedade brasileira, inexiste vontade livre e deliberada de discriminar, mas fazem-se presentes mecanismos e estratégias que dificultam a participação da pessoa negra no espaço de poder".
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O desafio de unificar o país contra o Racismo e Preconceito

No momento em que o racismo e o preconceito racial mobilizam pessoas em várias partes do mundo, no Brasil a Presidente da Comissão Nacional de Promoção da Igualdade (CNPI) da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Silvia Cerqueira afirma que aqueles que historicamente são privilegiados precisam se aliar à luta dos negros, e cita a filósofa norte-americana Angela Davis: "Não basta não ser racista, precisamos ser antirracistas". Silvia frisa a necessidade de que mulheres negras ocupem mais e mais espaços de destaque na sociedade, por meio de políticas de inclusão e "abertura de privilégios".
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Discriminação Racial que gera Discriminação Social

A Inclusão Social pela Economia foi uma ação adotada pelos Estados Unidos: Dinheiro dos Negros para os Negros e Voto dos Negros para os Negros.

É verdade que por lá o racismo não acabou, mas são conhecidos os inúmeros Casos de Sucesso em todos os setores da economia e da política. Diferente do Brasil, a condição de vida dos negros americanos alcançou os chamados degraus da Mobilidade Social.

Finalmente, diversas iniciativas de apoio ao empreendedorismo "by black" também se multiplicam por aqui, justificando nossa proposta. O momento é agora!
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